A Educação Romana
«O espírito prático romano manifesta-se (…) na educação, que se inspirou, entre os romanos, nos ideais práticos e sociais. Na história da educação romana podem-se distinguir três fases principais: pré-helenista, helenista-republicana, helenista-imperial. A primeira e fundamental instituição romana de educação é a família de tipo patriarcal, germe de uma sociedade mais vasta, que vai da cidade ao império: os patres governam a coisa pública. Educador é o pai, que na sociedade familiar romana desempenha também as funções de senhor e de sacerdote – paterfamilias.
Nesta obra educativa colaborava também a mãe, especialmente nos primeiros anos e no concernente aos primeiros cuidados dos filhos, sendo, em Roma, mais considerada a mulher do que na Grécia, dadas as suas predominantes qualidades práticas. O fim da educação é prático-social: a formação do agricultor, do cidadão, do guerreiro (…). Essencialmente práticos e sociais são os meios: o exemplo, o treino ministrado pelo pai que faz o filho participar na sua actividade agrícola, económica, militar e civil, a tradição doméstica e política (…)e a religião – pietas – entendida como prática litúrgica, sendo a religião, em Roma, diversamente do que era na Grécia, sumamente pobre de arte e de pensamento. E tudo isso sob uma disciplina severa.
Enfim, prático-social era o próprio conteúdo teorético da educação, a instrução propriamente dita, que se reduzia a uma aprendizagem mnemónica de prescrições jurídicas, concisas e conceituosas – as leis das doze tábuas – que regulavam os direitos e os deveres recíprocos naquela elementar mas forte sociedade agrícola-político-militar.
A educação romana sofreu necessariamente uma profunda modificação, quando o antigo estado-cidade, desenvolvendo-se e expandindo-se para a nova forma do estado imperial – entre o terceiro e o segundo século a.C. – veio em contacto com a nova civilização helénica, cuja irresistível fascinação também Roma sofreu.
Sentiu-se então a exigência de um novo sistema educativo, em que a instrução, especialmente literária, tivesse o seu lugar. Esta instrução literária partiu precisamente da cultura helénica. Primeiro são traduzidas para o latim as obras literárias e poéticas gregas – por exemplo, a Odisseia -, depois estudam-se os autores gregos no texto original, enfim se forma pouco a pouco uma literatura nacional romana sobre o modelo formal da grega. E, deste modo, a princípio é a literatura grega que se difunde em Roma, depois, mediante a literatura, é o pensamento grego que penetra e se difunde, e afinal, através do pensamento, entra e se espalha a concepção grega da vida (…).
Evidentemente, a família não estava mais à altura de ministrar esta nova e mais elevada instrução. As famílias das mais altas classes sociais hospedam em casa um mestre, geralmente grego –pedagogus ou litteratus. E, para atender às exigências culturais e pedagógicas das famílias menos abastadas, vão-se, aos poucos, constituindo escolas – ludi – de instituição privada sem ingerência alguma do estado. Essas escolas são de dois graus:elementares – a escola do litterator onde se aprendia a ler, escrever e calcular; médias – a escola do grammaticus – onde se ensinava a língua latina e a grega, se estudavam os autores das duas literaturas, através das quais se aprendia a cultura helénica em geral. Um terceiro grau será, enfim, constituído mediante asescolas de retórica, uma espécie de institutos universitários, que surgem com uma diferenciação e uma especialização superior da escola de gramática.
A sua finalidade era formar o orador, porquanto a carreira política representava, para o espírito prático romano, o ideal supremo. E, portanto, o ensino da eloquência abrangia toda a cultura, do direito até à filosofia. O orador romano será o tipo do homem de acção, do político culto, em que a cultura é instrumento de acção – negotium e, logo, para os romanos, coisa muito séria, em relação com a seriedade da acção, e não simples distracção – otium. (…) A cultura helénica e os mestres gregos afluem a Roma sempre mais numerosos e bem acolhidos, enquanto a elite dos jovens romanos se vai aperfeiçoar nos centros de cultura helenista, especialmente em Atenas.
A sua finalidade era formar o orador, porquanto a carreira política representava, para o espírito prático romano, o ideal supremo. E, portanto, o ensino da eloquência abrangia toda a cultura, do direito até à filosofia. O orador romano será o tipo do homem de acção, do político culto, em que a cultura é instrumento de acção – negotium e, logo, para os romanos, coisa muito séria, em relação com a seriedade da acção, e não simples distracção – otium. (…) A cultura helénica e os mestres gregos afluem a Roma sempre mais numerosos e bem acolhidos, enquanto a elite dos jovens romanos se vai aperfeiçoar nos centros de cultura helenista, especialmente em Atenas.
Juntamente com a organização do império organizam-se também as escolas romanas. Por certo, vindo a faltar a liberdade, vem a faltar o interesse político da cultura; as escolas de retórica perdem a função prática e social, transformando-se em meios de ornamento intelectual entre os lazeres de uma aristocracia cultural (…). Seja como for, o estado romano mostra agora apreciar a cultura. Começam os imperadores romanos por conceder imunidade e retribuições aos mestres de retórica ainda docentes em casas particulares; depois o Estado passa a favorecer e a promover a instituição de escolas municipais de gramática e de retórica nas províncias; enfim são fundadas cátedras imperiais, especialmente de direito, nos grandes institutos universitários.
Um dos principais motivos de interesse imperial pela cultura e a sua difusão foi o facto de se ver nela um eficaz instrumento de romanização dos povos, um instrumento de penetração e de expansão da língua e do jus [Direito] romano, um meio, em suma, para o engrandecimento do império. E o resultado foi fecundo também para a cultura como tal, porquanto foi ela levada, embora modestamente, aqueles povos – Espanha, Gália, Grã-Bretanha, Germânia, províncias danubianas, África setentrional – a que o helenismo não pudera chegar.
Tais escolas municipais foram tão vitais nas províncias, que muitas sobreviveram à queda do império romano ocidental, transformando-se em escolas eclesiásticas graças ao monaquismo cristão, e conservaram acesa na noite barbárica a chama da cultura clássica, preparadora dos esplêndidos renascimentos posteriores.
O teórico da pedagogia romana pode ser considerado Quintiliano. Nasceu na Espanha no II século d.C., foi professor de retórica em Roma, o primeiro docente pago pelo Estado, quando Vespasiano era imperador. Na Instituição Oratória, em doze livros, expõe o processo de formação do orador – cuja figura ideal já delineara Cícero no De Oratore. Faz Quintiliano uma exposição completa, propondo programas e métodos que foram em grande parte adoptados sucessivamente nas escolas do império. A instituição escolástica compreende os dois graus tradicionais de gramática e retórica. No curso de gramática ensinam-se a língua latina e a língua grega, a interpretação dos poetas – Virgílio e Homero – e as noções necessárias para este fim. No curso de retórica ensinam-se a interpretação dos historiadores – Tito Lívio – e dos oradores – Cícero -, o direito e a filosofia, enquanto fornecem o conteúdo essencial à arte oratória. Um lugar de destaque ocupa as normas e as exercitações de eloquência, o fim supremo da educação romana, segundo o espírito prático-político romano.»
Fonte: Direito e Educação
Sem comentários:
Enviar um comentário